Procedimento licitatório para manutenção de equipamentos hospitalares sem a devida composição dos custos na planilha orçamentária enseja responsabilização dos gestores
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- 4 de nov.
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Trata-se de denúncia apresentada pela empresa Xxxxxxxxxx Ltda. contra procedimento licitatório deflagrado pelo Executivo Municipal de Descoberto, cujo objeto era a contratação de empresa para manutenção preventiva e corretiva de equipamentos hospitalares e odontológicos. ____________
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Foram apontadas diversas irregularidades, entre elas: a realização do pregão na modalidade presencial em detrimento do pregão eletrônico; a restrição da impugnação do edital exclusivamente pela via presencial; a exigência de inscrição das empresas no Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (Crea); a exigência de Autorização de Funcionamento (AFE) emitida pela Anvisa; a existência de requisitos técnicos restritivos e potencialmente direcionadores; e, a insuficiência das informações no edital, especialmente no que tange a apresentação de planilha de custos unitários. O processo foi distribuído à relatoria do conselheiro Agostinho Patrus, que analisou as supostas irregularidades conforme a seguir:
No que tange à modalidade do pregão, a análise técnica e o Ministério Público se manifestaram no sentido de que, conforme o art. 176, II, da Lei n. 14.133/2021, municípios com até 20.000 habitantes, como Descoberto, possuem prazo de seis anos para adaptação à obrigatoriedade do pregão eletrônico. O relator esclareceu que a referida regra visa assegurar a adaptação gradativa da Administração Pública municipal à nova sistemática licitatória. Citou que, segundo o Censo 2022 do IBGE, Descoberto contava com 4.928 habitantes, motivo pelo qual, acolheu a manifestação técnica e ministerial para julgar improcedente o apontamento
Quanto à limitação da impugnação do edital apenas à via presencial, o relator esclareceu que a utilização de meios digitais, como instrumento de apoio às atividades da Administração Pública, tem adquirido relevância crescente, de modo que disposições que restrinjam ou omitam sua utilização carecem de respaldo legal e atentam contra o princípio da eficiência administrativa. Assim,considerando que o edital previu apenas a possibilidade de adoção do protocolo presencial para impugnações e esclarecimentos, entendeu que houve limitação ao exercício do direito ao contraditório e à ampla defesa no certame, motivo pelo qual julgou procedente esse apontamento. Contudo, o relator salientou que, tendo em vista que a agente de contratação respondeu a e-mails, além de acolher pedido formulado por interessado no sentido de alterar o edital, não foi verificado prejuízo ou restrição à competitividade do certame, motivo pelo qual, deixou de aplicar multa.Não obstante, advertiu os atuais gestores para que, em futuros certames, assegurem a redação de cláusulas editalícias claras e abrangentes, contemplando expressamente a possibilidade de apresentação de impugnações, pedidos de esclarecimentos e recursos administrativos também por meios eletrônicos, e não apenas de forma presencial.
Sobre a exigência de Autorização de Funcionamento (AFE) emitida pela Anvisa, o relator reconheceu que, conforme o art. 5º, V, da RDC n. 16/2014 da Anvisa, essa autorização não é obrigatória para empresas que realizam exclusivamente instalação e manutenção de equipamentos de saúde. Citou como precedentes jurisprudenciais as denúncias n. 1153283 e n. 1066687, ambas reafirmando a dispensa da AFE em casos idênticos. Neste sentido, julgou procedente o apontamento, sem, no entanto, aplicar multa, vez que entendeu que não houve prejuízo ao certame ou à Administração, bem como não restou caracterizado erro grosseiro apto a ensejar a responsabilização dos gestores. Todavia, advertiu os atuais gestores para que se abstenham de exigir a AFE em situações semelhantes.
Quanto a ausência de informações precisas no edital e apresentação de planilha de custos, o relator corroborando o entendimento da unidade técnica, considerou que a elaboração da planilha orçamentária sem a devida composição dos custos dos itens e sem a indicação, de forma clara, dos materiais a serem objeto de manutenção, bem como dos respectivos quantitativos unitários e totais, comprometeu a transparência do edital e do orçamento, acarretou prejuízos ao controle e dificultou a adequada formulação das propostas pelos licitantes. Assim, julgou procedente o presente apontamento, em face da inobservância do disposto no art. 18, II e IV, da Lei n. 14.133/2021, aplicando multa de R$ 3.000,00 tanto ao Secretário de Saúde quanto à agente de contratação e signatária do edital.
Quanto às exigências de qualificação técnica, especialmente os subitens 6.5.5 a 6.5.8 do edital, que previam certificados de calibração de diversos equipamentos e registros junto ao Instituto de Metrologia (IPEM), o relator constatou que, embora tais exigências possam ser necessárias, a falta de delimitação precisa do objeto da licitação potencializou restrição indevida à competitividade. A vedação expressa à subcontratação, prevista no edital, foi considerada legal, desde que a Administração realize análise crítica da sua aplicabilidade. A inclusão dessas exigências após impugnação e a ausência de fundamentação técnica adequada também reforçaram a procedência do apontamento. No entanto, em razão da aplicação de multa no item anterior e em observância ao princípio non bis in idem, não aplicou nova multa aos responsáveis.
Sobre a exigência de inscrição das empresas no Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (Crea), a denúncia sustentou que a manutenção de equipamentos médico-hospitalares não é privativa de engenheiros, podendo ser realizada por técnicos industriais habilitados, conforme a Lei n. 5.524/1968 e a Resolução n. 121/2020 do Conselho Federal dos Técnicos Industriais. A análise técnica confirmou que há sobreposição de atribuições entre engenheiros e técnicos industriais, e que a ausência de descrição precisa dos serviços e equipamentos inviabilizou a demonstração da pertinência da exigência do registro no Crea. Nesse sentido, o relator julgou procedente o apontamento, uma vez que a ausência de justificativa para demonstrar a necessidade da referida exigência é potencialmente restritiva e prejudica a competitividade do certame. No entanto, em observância ao princípio non bis in idem, deixou de apenar os responsáveis.
Em conclusão, além da multa aplicada aos responsáveis, o relator advertiu os atuais gestores do município para que, em futuros certames:
· assegurem a redação de cláusulas editalícias claras e abrangentes, contemplando expressamente a possibilidade de apresentação de impugnações, pedidos de esclarecimentos e recursos administrativos também por meios eletrônicos, e não apenas de forma presencial; e
· abstenham-se de exigir Autorização de Funcionamento – AFE de estabelecimentos ou empresas que se limitem à instalação, manutenção e assistência técnica de equipamentos de saúde, nos termos do art. 5º, V, da Resolução de Diretoria Colegiada – RDC n. 16/2014 da Anvisa.
O voto do relator foi aprovado por unanimidade.
Processo 1170850. Primeira Câmara. Relator conselheiro Agostinho Patrus. Deliberado em 21/10/2025





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